Minas/Bahia, um torneio para não esquecer

Caros amigos,

Claudinho chegou, precisamente, às 8h10m na casa de minha filha e, seis horas depois de uma viagem tranquilíssima, desembarcávamos na porta do hotel Promenade Platinum de Belo Horizonte. Eu conhecia o Promenade de outros carnavais bridgísticos na capital mineira e, por isso, logo afastei eventuais dúvidas de acomodação. Trata-se de hotel acolhedor, confortável, sem extravagâncias e preço justo. Apenas estranhei que dentre os itens de higiene e banho costumeiros, estivesse lá, quase intruso, um preservativo.

Graça e Ana Pierotti deixaram recado na portaria para que fossemos encontrá-las num botequim próximo. Cysneiros juntou-se ao grupo e lá fomos nós para a primeira reunião formal da equipe. Até então, não desconfiávamos que faltava um astro para compor o time, mas eis que surge Sérgio Aranha, suprindo, com simpatia e talento, o espaço vazio. À noite, o casal mais querido de Belo Horizonte, Tereza e Damião, recebeu os bridgistas de outros estados para um jantar na sua mansão de gente bacana. Todos muito elegantes, menos eu, que não levara roupa de elegância. Não sabia da recepção e não fui preparado para a ocasião. Mas ninguém notou, ou fingiram não notar, talvez por fidalguia, talvez por causa da alegria daquele encontro, mas desconfio que o motivo, no duro, foi a bebida (whiky, champanhe, vinho e cerveja) e a comida (salmão marinado e um patê de foie gras com geleia de tirar o fôlego, isso só de entrada, tudo pelas mãos de Andreia Misk). Não me detive no prato principal porque me esbaldei com as entradas. Só Gabriel comeu e bebeu de tudo e repetiu. A acolhida de Tereza e Damião surpreende até os mais céticos do gênero humano. É bom jogar bridge apenas para privar da companhia de pessoas genuinamente amigas e carinhosas, sem nenhum artifício.

No dia seguinte, quinta-feira, começou a competição com sete equipes inscritas, 14 rodadas de dez bolsas, turno e returno, de quinta-feira a sábado. O jogo teve início com breves discursos do anfitrião, do Presidente da FBB, e de explicações do árbitro, Thiago. Havia no certame uma curiosidade; disputava-se, em paralelo ao tradicional torneio Bahia/Minas, o sênior para o mundial de 2019, mas que contava apenas com duas equipes, o esquadrão do Rafael, formado por Guilherme Junqueira, Eduardo Barcellos (leia-se Elemento –“Tá querendo me irritar?”), Gabriel Chagas, Leda e Marcelo Branco e a minha, cujos integrantes já revelei. A nossa participação, nessa última modalidade, criou, depois, um sério estresse na equipe, eis que Graça não desejava, em hipótese alguma, disputar o sênior, apesar de ser um único torneio a abranger as duas competições de forma absolutamente homogênea. Isto é, as equipes, todas elas, jogariam entre si, em dois round robins, sem que houvesse final. A distinção aconteceria, meramente, no momento da premiação. Mas Graça tinha um propósito claro: vencer o Bahia/Minas. Entretanto, mais ainda a aborreceu o fato de não ter sido consultada sobre a participação no sênior. Por isso, zangou-se muito quando soube, e assim persistiu até o final do campeonato. Sua indignação era legítima, mas, o seu objeto, a meu ver, pouco relevante. Contudo, talvez fosse, para ela, e, sendo assim, aqui só me resta pedir pungentes desculpas. Aliás, Graça terminou o último tempo discutindo com Botrel. Muitas emoções para Belo Horizonte. Mas o certo é que a nossa equipe ficou distante de qualquer lugar mais honroso no pódio, eis que terminamos em quinto, embora no final do round robin inicial estivéssemos em primeiro. Depois, entramos no joguinho, perdemos cinco jogos seguidos. Como era esperado, Rafael logrou, com tranquilidade absoluta, a vaga no mundial de 2019, por sua vez, Damião e os mineiros, com dois penetras... (Alexandre, Elizabeth, André, Marco Aurélio e Clódio) asseguraram o primeiro lugar no Bahia/Minas e, Vilma, Marcio, Áurea e Angélica, o vice-campeonato.

Nem só do jogo viveram os aventureiros do Bahia/Minas, a cidade de Belo Horizonte não permite sonecas no hotel entre partidas. Tive mais sorte do que os demais porque me levou para passear e descobrir os esconderijos de BH, Ana Pierotti, a mais gentil das criaturas, psicóloga, mas fazendo ali o papel de iluminada cicerone. Ela se apaixonara anos antes por um nativo, com o qual se casaria, e, antes do matrimônio, ia visita-lo sempre que podia, tornando-se, portanto, uma expert da capital mineira.

Conheci o Parque das Mangabeiras, a Praça do Papa, a Rua do Amendoim (você desliga o motor e o carro desce na subida!!!), e, principalmente, os inúmeros bares/livrarias, ou vice-versa , predestinados a oferecer um chope gelado e boa leitura, ou vice-versa. É possível frequentar sozinho, sem se sentir só; prato cheio para a turma da rejeição.

Não mencionei aqui os restaurantes, cada um melhor do que o outro, juro. Jantamos em quatro ou cinco, sem reclamações, apenas com o protesto do Claudinho, em um deles, pelo fato de seu bife estar bem passado. Não quis pagar a gorjeta. Deve-se lidar com o perfeccionismo do Claudinho com o máximo de cuidado. Na derradeira noite em Belo Horizonte, passou em claro pensando numa bolsa do último tempo: você, em Sul, tem a seguinte mão: Jx, AR xxxx, A, ARJx. Segundo a falar, abre uma copas, ouve 1ST do parceiro, e aí (?). Minha adversária, Tereza, jogando com Andreia, declarou três copas, a parceira repetiu ST, três passos se seguiram. Conclusão: 3ST feitos com duas finesses a favor. Simples assim. Vejam agora a mão da Andreia: ADx, x, Jxxxx, 9xxx. Detalhe, as copas estavam seis a zero. Meus reflexos, Ana e Graça, aterrissaram em cinco copas (duas vazas menos-800 para a equipe da Thereza). É difícil escapar, mas as minhas adversárias não tiveram nenhuma dificuldade. Todavia, o problema da mão e também da noite insone do Claudinho deveu-se ao fato de que o computador sublinhara que o par da mão era o contrato de 5 paus, entretanto, o nosso empedernido parceiro não encontrava a linha ganhadora. De manhã cedo, disse que trazia no colete uma resposta e muitas variantes. Sei lá...

Os dias passados em BH não foram de tédio para as esposas não jogadoras, Bia, Marleuse, e Camila foram visitar Inhotim e voltaram maravilhadas. Marcia viu-se compelida a substituir uma jogadora de última hora e pode mostrar sua incondicional leveza de trato, além de segurança no desenho do jogo. Andrea trabalhou tempo integral (Junqueira não dá refresco). Et pour cause, é bom que se ressalte, Thiago, na arbitragem, e Andrea , respondendo pela parte administrativa, deram um banho de competência. Igualmente, não sem razão, driblaram a burocracia, dirigiram-se ao pano verde e se sagraram campeões no torneio de duplas. Parabéns!

Gente, a turma que veio de São Paulo (Leão, Sabag, Rafael e Arthur, além daqueles aqui citados), Rio e Bahia, não tem do que se queixar. Não há reparos ao torneio Minas/Bahia, uma festa digna das Minas Gerais. Releve-se, a propósito, em outro cenário, que Rafael é um festeiro por excelência e adora o Bridge, e você, querendo ou não vencer o campeonato sul americano de 2018, deve participar e reservar logo sua passagem para Comandatuba, em maio. Não haverá tempo hábil para ser infeliz.

Falo tudo isso porque lamentei muito a ausência de muitos dos nossos amigos, aqui e acolá. Não consigo imaginar um torneio realizado no Brasil sem a participação, sequer, de um único representante da família Amaral. Contudo, confesso que a ausência mais sentida para mim no Minas/Bahia foi a do Aloi, com aquele seu sorriso aberto que encanta qualquer um. Mas soube que ele logo estará entre nós. Força, Aloi!

No último dia, pela manhã, tive o prazer de despedir-me de Minas tomando café com André, uma verdadeira simpatia, gente como a gente gosta, que preferiu não jogar as duplas, mas, sim, passear com Camila em Ouro Preto.

Claudinho, depois de passarmos no Armazém Central para comprar uma peça de torresmo de barriga e um queijo da Serra da Canastra, deixou-me em casa, em Itaipava, por volta de uma da tarde. Permaneceu ainda por alguns minutos para um derradeiro whisky. Duas horas depois, telefonou-me do Rio perguntando o que deveria fazer com a minha mala que eu esquecera no seu carro. Refletindo sobre o acontecido, me vi martelando sobre a seguinte questão que me afligia desde que cheguei ao quarto do hotel em Minas: por que deixaram ali um preservativo, pra que, meu Deus?