A carta mais importante da mão 2 (Paulinho Brum)

Paulinho Brum
www.thebridgeexperts.com

O artigo anterior foi dedicado às saídas contra contratos em ST. A situação em contratos de naipe é diversa, porque o ataque tem mais estratégias possíveis. Vejamos uma lista das possíveis intenções do saidor contra um contrato em trunfos:

  • Cobrar vazas imediatas
  • Estabelecer vazas de honras
  • Estabelecer um corte (saída em naipe curto)
  • Dar um corte ao parceiro
  • Retirar vazas de corte do carteador (saída de trunfo)
  • Encurtar o carteador
  • Interferir na comunicação entre carteador e morto (tipicamente, tentar arrancar a entrada lateral do morto, que possui um naipe bom que pode ser firmado ao longo do carteio)
  • Não buscar nenhum dos caminhos acima – a famosa “saída passiva”, que busca acima de tudo não dar vazas

Vejam que a (clássica?) dicotomia de saída ativa x saída passiva é muito pobre para descrever a variedade de opções à disposição do saidor. Enquanto nos contratos em NT a estratégia é quase sempre a mesma – estabelecer o melhor naipe longo da dupla (seja ele o seu naipe, seja o naipe de seu parceiro), o bom saidor, ao atacar um contrato em trunfo, tem um farto menu de opções. Como escolher?

Não há uma fórmula simples que lhe dará sempre o melhor resultado. Mas há um método que vai pelo menos lhe ajudar a eliminar as piores estratégias, que é a visualização das mãos adversárias, em dois componentes básicos: força e distribuição. Para melhorar suas saídas, antes de sair, faça as seguintes perguntas: 1. quanto jogo meus adversários devem ter? (Notem que isso lhe dará uma estimativa de quanto jogo seu parceiro tem) 2. Quantos trunfos meus adversários devem ter, e como é esta divisão? 4-4, 6-2? 7-1? 5-4, 6-4? Sua estratégia de saída vai se basear fortemente nas respostas a estas duas perguntas, pois elas permitirão que você elimine caminhos que não são promissores.

Por exemplo. Quando os adversários defendem um slam (i.e., você marcou um slam com esperança de ganhar, e eles marcaram um contrato mais alto, em defesa, com o objetivo de pagar menos nas multas do que o valor do slam), é normal e corriqueiro sair de trunfo. Por que? Porque (1) eles têm pouco jogo, (2) eles têm muitos trunfos, e (3) eles não devem ter baldas imediatas que requeiram que você cobre suas vazas imediatamente. Faz sentido, não?

Vocês já devem estar ansiosos por algumas cartas. Vejamos exemplos mais concretos.


Quanto jogo o parceiro tem? Pelo menos uns 7/8. Quantos trunfos eles têm? Não muitos. Foi um leilão de mera preferência. Eles podem inclusive estar em um misfit (trunfos 5-2), não seria raro neste leilão. O que o morto tem nos pobres? Sabemos de um item importante – ele preferiu ouros. Ele não está longo em paus.

Se você juntar estas pistas e visualizar como o carteador pretende jogar a mão (se tiver, por exemplo, 3 ouros e 1 paus no morto), você verá que a saída de copas, tão apetitosa, não é boa. Na verdade, esta é uma mão em que a saída de trunfo é automática, para diminuir a quantidade de cortes no lado curto que o carteador fará. Suas vazas de copas não vão sumir se vc. sair trunfo.

Uma situação completamente diferente seria esta:


A saída de espadas é segura (= passiva), mas se você pretende derrubar o contrato, certamente não é a melhor. Como deve ser o desenvolvimento do carteio? O carteador vai tirar trunfos (arrancando seu Ás), e depois provavelmente baldar perdedoras nas copas da mesa (talvez firmando estas copas com cortes, talvez não – suas três brancas não são boa notícia aí).

Em contratos de slam, não há tempo para passividade. Você precisa firmar uma vaza para cobrá-la assim que fizer o Ás de ouros (ou as perdedoras do carteador serão descartadas), e sua melhor chance é torcer para a Dama de paus na mão do parceiro, saindo de paus. Parece pouco atraente, mas é certamente a melhor saída. (Se ela der uma vaza, provavelmente é uma vaza que teria sido baldada mais tarde).

Vejamos um exemplo de saída onde a passividade é indicada:


Quanto jogo o parceiro tem? Muito pouco. Temos um Ás e um Rei, afinal de contas.

Como devem ser as mãos? Aparentemente balanceadas, ou algo parecido.

Há algum naipe longo onde se possa descartar perdedoras? Aparentemente, não.

Todos os sinais apontam para a saída passiva. Não sou lá muito fã da saída de trunfos como tentativa de passividade, mas – em especial se eles jogam keycard, ou seja, se garantiram AK de trunfos (pois eu tenho um Ás) – a saída de 10 de espadas parece boa.

Tente encontrar a saída fatal na próxima mão. Vou guiá-lo por meio das perguntas certas.


3 Ouros é forte. Norte mostrou 2 Ases e 1 Rei.

Como são as mãos adversárias?

Norte tem espadas remarcáveis. Sul tem ouros sólidos. Sul tem cuebid de paus, Norte tem cuebid de copas.

Uma possibilidade evidente de produção de vazas para o carteador é firmar as espadas do morto. E elas estarão bem divididas (mesmo que estejam 6-1). Para atrapalhar este plano, o melhor é arrancar alguma entrada do morto. E o morto possui o Ás de copas. Logo, esta é a saída.

Nos livros e problemas de bridge a recomendação seria a saída com o Rei, mas aqui basta sair copas para derrubar:


A última mão ocorreu numa final de um campeonato americano, em 2010:


O adversário da direita, vulnerável, abriu de 4 Copas. Você, não vulnerável, marcou 4 Espadas. O leilão seguiu assim:


E aí, qual a saída e por que?

Eu não teria dúvida, jogando contra adversários competentes, de que o Ás de espadas não passa. (Eles estão vulneráveis, e nós não!). Esta seria a saída passiva da mão. Seria esta a melhor saída neste caso? Com base na vulnerabilidade (eles devem ter alguma fonte de vaza), acho que não. Logo, temos que tentar firmar vazas na mão do parceiro (que, afinal de contas, dobrou). Até aí vai meu raciocínio. Qual naipe pobre sair, então? Eu acho que sairia de ouros (que tem menos chance de dar uma vaza imerecida se minha leitura da mão estiver toda errada), e me daria mal:


A saída que derruba é paus. Mas a lição importante da mão é: fazer as perguntas corretas, diagnosticar a chicana de espadas em algum lugar (será mesmo que os adversários vulneráveis estão marcando 5 e 6 Copas sem essa chicana?), entender que a saída de espadas seria passiva, e que pode haver uma certa urgência em estabelecer vazas na mão do parceiro.

(Muito embora a maior lição da mão seja que o seguro morreu de velho e que E-O deveriam estar defendendo em 6Sx, como ocorreu na outra mesa).